13.6.08

INVENTÁRIO
Recebi uma herança. 100 milhões de Euros. Com tudo isso, não preciso de trabalhar. Posso estudar para sempre. Posso ajudar os amigos. Posso organizar eventos em benefício de todos que precisam de alguma coisa. Posso fazer um voto de humildade e não demonstrar riqueza. Porque é muita falda de respeito, nesse país, mostrar-se rico. A riqueza da aristocracia não faz bem para as relações sociais.
Poderia doar, sem prejuízo, 90% desse valor e continuar com tudo o que mencionei. Poderia, ainda assim, comprar uma casinha modesta na Vila Madalena e andar com os pés, não com gasolina. Nessa casa, bastaria uma mesa, uma estante com livros, uma cama, um banheiro e uma geladeira. A geladeira, sempre abastecida para receber os amigos; as caravanas filosóficas...
Compraria todo o espaço publicitário da Globo, só pra dizer que a Globo não presta. Construiria um cinema e passaria filmes essencialmente não hollywoodianos. Pagaria o jabá de todas as rádios e colocaria música de respeito.
Faria tudo para o bem.
Porém, fiz diferente. Recusei a herança. Recusei 100 milhões de Euros. Preferi não fazer o bem. Preferi ficar na ignorância e deixar o povo se virar. Preferi achar que sou mais importante; que essa herança é pouca, comparando-a com a minha infinita grandeza...
Estranho, não acha? Que alguém seja capaz de pensar assim... Muito estranho.
Então, por que recusamos a herança que nos foi deixada? Por que recusamos Vinícius de Moraes, Tom Jobim, Cartola, Candeia, Paulinho Nogueira, Baden, Villa e tantos outros?
Por que recusamos o que poderíamos usar para o bem?
Acordem, todos... Estamos perdendo para a ignorância.

12.6.08

SOBRE A FLUIDEZ DOS TONS
O cuidado na escolha da música é crucial para o seu bem-estar. Porque a música incompatível com a situação nos impede de vivê-la adequadamente. Digo sobre dois tipos de situações diferentes: a primeira, aquela que ocorre quando você acerta tanto na escolha da música que pode sentí-la fluir por todo seu corpo, como numa espécie de integração total com o seu próprio mundo. É o tipo de acontecimento que nos dá a noção de que a música não é apenas trilha sonora, mas também e principalmente protagonista daquela específica cena... A segunda situação é aquela da impossibilidade de se achar a música ideal para aquele momento. O que vai com esse clima? O que vai com essa sensação? E assim por diante, para simplificar. Nesse tipo de indecisão, considere inovar, pois que, viver é inovar liberdades, dentro de dois únicos limites: o bem e a criatividade.
Quando estiver com problemas para escolher a música, não hesite: preze pela fluidez e garanta que a música não seja a trilha sonora da sua vida. Se existem pessoas como nós, que vivemos de música, porque não considerar que a música vive da vida?
Pois, com a música não se decide; se resolve. "Tudo que é sólido se dissolve no ar" (M. Com.).
A música, em sua propagação mais lenta e calma, não perde para a luz, que só se conhece pelos resultados, pois que não podemos vê-la. O silêncio de olhos abertos não chega ao patamar da música de olhos fechados.