PRAÇA DA SÉ E XV DE NOVEMBRO
Quando estou no Centro de São Paulo, estou sempre trabalhando. Como não posso usar essa desculpa para dizer que não observo as coisas, direi o que percebi ontem, no meu trajeto entre a Praça da Sé e a Rua XV de Novembro.
Percebi as entrelinhas dos seres que ali habitam. Percebi, por exemplo, um homem branco, de de gravata, mas sem paletó, que pregava a palavra do Senhor usando um microfone e um pequeno amplificador. Entretanto, poucos metros adiante, havia um homem negro. De paletó e gravata, sem microfone ou coisa do gênero, pregava o mesmo assunto. Mas, quando esse homem começava a falar, nenhum microfone ou amplificador serviriam para abafar a sua voz. E as pessoas o pediam por uma palavra paricular, direcionadas a ela diretamente. E o homem negro punha a mão na cabeça da senhora com carrinho de feira e fazia a sua parte. A paixão daquele homem derrubava qualquer pretensão de qualquer microfone ou amplificador.
Mais adiante, um homem amarrou uma corda entre uma árvore e um poste. Com um tênis, este amarrado à corda, repetia: - "Faço dessa minha arma contra os gigantes que atentem contra mim. Eu não existo para o mundo e, por isso, não tenho medo dele. Estou em vantagem." Mas ele existia. No mínimo, existia para as pessoas que assistiam ao teatro de rua.
Muitos temem o Centro de São Paulo. Isso me parece um engano. As entrelinhas da existência humana se sobrepoem aos assaltos, sempre que você exercitar a habilidade da observação. Depois de ontem será fácil ir ao Centro com um sorriso estampado.
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